sábado, 19 de fevereiro de 2011

O Cinzão

Quando a notícia joga na cara que somos um referencial de pobreza


Quando chegamos à estação de trem, o pensamento pessimista começa a dominar nossa mente. Pois só de imaginar aquele trem cheio, sem ar condicionado, com as pessoas amarrotadas, e completamente abafado, a força para ir contente ao trabalho vai embora. Essa é a rotina do ‘cinzão’.



‘Cinzão’ é o apelido carinhoso para os trens da linha diamante da CPTM. Diamante só se for por ironia ou muita bondade. O trajeto que vai da Estação Julio Prestes até a cidade de Itapevi passa pelas mais impressionantes deteriorações urbanas, como incontáveis favelas, prédios abandonados na região da Luz e na Lapa e a falta de urbanização em Carapicuíba.

Sem contar, que a linha ‘cinzenta’ parece ter sido a última a ser lembrada em relação a reforma da frota. Somente neste mês alguns veículos novos foram vistos. Estes, com ar condicionado e conforto. Mas nada vem de graça para a periferia. Ele tem vagões a menos, ou seja, mais lotação.

Comparativo de pobreza
Eis que você abre o jornal e se depara com uma matéria que mostra o que os usuários destes trens significam para quem tem poder.

A manchete começa com “Metrô da Paulista lota mais que trem”. Até aí, tudo bem, uma matéria que mostra um dado interessante sobre o aumento do uso, mas veja a sequência: “total de passageiros por metro quadrado cresce de 4,7 para 5,9 e se aproxima do índice de desconforto extremo”. Grave aí o desconforto extremo, o que a principio não tem relação com o ‘cinzão’, embora seja a definição perfeita.

“Aperto em linha nobre do metrô de São Paulo já chega a ser pior do que o registrado em 3 das 6 linhas da CPTM”. A notícia fica alarmante, como se o transporte público não estivesse saturado no geral.

Mas aí vem a melhor parte: “Engravatados da Avenida Paulista estão mais apertados dentro do metrô do que moradores de Carapicuíba, Itapevi ou Itaquaquecetuba...” “O efeito lata de sardinha com que a periferia vive há anos, atingiu a linha-2 verde...”

Logo, quem pode, pode. Os moradores de Itapevi, Jandira, Carapicuíba, Osasco, Itaquaquecetuba, Ribeirão Pires, Santo André, São Caetano, Caieiras e outros, podem usar o trem velho e cheio, os ‘cinzões’. Tanto podem, que é algo normal, e assim deve ser por toda a vida. Agora quando os ‘engravatados’ enfrentam um metrô confortável, mas lotado, se torna até notícia de jornal.

Assim é feito o comparativo da pobreza. Pelo menos, é o que deve sentir um usuário do cinzão.

3 comentários:

Anônimo disse...

Parabéns, Paulão! É isso mesmo que sente o usuário de um trem metropolitano.

Arídia disse...

Nossa me lembrei dos velhos tempos do "cinzão"...e dei muita risada! Muito bom Paulo!

Italo disse...

Texto perfeito! Tudo o que quis escrever sobre aquele lixo que a Folha de S. Paulo chama de texto! Um texto preconceituoso, onde denigre a população usuária de transporte público. E ledo engano do jornalistinha que escreveu aquele texto: nosso trem da CPTM nada mais é que um trem METROpolitano ou seja, é a mesma coisa, o mesmo modelo. A única (e ao que tudo indica, em breve, essa diferença cairá por terra) são as distâncias percorridas, seja entre estações (Metrô Urbano em média 800m a 1km e trem metropolitano de 1km a 5km), já que a linha 4 - Amarela poderá chegar em Taboão da Serra. Parabéns!

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